Cerimônia da lavagem das escadarias da Igreja da Sé (Olinda), ontem, por conta de impedimento (rachaduras)na Igreja de Nosso Senhor do Bonfim
LAVAGEM & VASSALAGEM
Antonio de Campos
O homem gosta de ser enganado.
Adorno
No tempo em que a Igreja & nossos colonizadores, ambos escravistas,
proibiam os negros de praticarem seus
cultos, estes,
oprimidos, lançaram mão do sincretismo.
E, dentre outros santos, sincretizararam
Jesus Cristo
(Nosso
Senhor do Bonfim, na Bahia) com Oxalá.
O sincretismo
não faz mais sentido.
Os negros já não precisam de fingir
prestar culto a Jesus Cristo
ou
ao Senhor do Bonfim ou a qualquer outro santo que seja,
visando enganar seus opressores,
estando com a mente voltada para seus Orixás.
Mas o povo-de-Santo (Candomblé) continua presos à tradição inútil
& desnecessária da permuta de Orixás por santos do panteão da Igreja,
quando tem o seu próprio panteão, com
idêntica dignidade
e mais beleza de culto e os pode
livremente cultuar.
Santos católicos da mesma verdadeira Igreja de Cristo,
permissiva & omissa, que até bem pouco tempo justificava,
de Bíblia
aberta nas mãos em Gênesis 9:25,
a escravidão negra,
possuindo ela própria escravos negros,
tornando assim explícito o seu apoio à
escravidão que deixou correr frouxa na América Latina,
cujos efeitos perniciosos perduram
até o momento numa sociedade hipocritamente
racista
em que os negros, construtores do Brasil,
têm menor acesso à educação do que os
brancos,
e, em compensação, maior acesso às
prisões do que os brancos.
E lá se vão eles, felizes, ladeira
abaixo na inocente cerimônia da lavagem das escadarias a partir das portas da Igreja da Sé (Olinda),
em puro estado de letargia ou da mais
decantada amnésia
de que do outro lado da rua exatamente,
ergue-se o Palácio de Yemanjá
(Terreiro
de Pai Edu),
donde poderiam sair lavando a Ladeira da Misericórdia
com água
de cheiro,
até essas águas doces & perfumadas
de Oxalá se encontrarem,
na planície, com as águas salgadas de Yemanjá,
águas do Oceano Atlântico
que, à mais bruta força, seus ancestrais
tiveram de atravessar,
sem que tivessem de prestar vassalagem
à Igreja
que abençoava aquela travessia e até ontem
tratava seus tatás* como objetos, bens, coisas, bestas,
a despeito de alguns santos pretinhos no
altar para engabelar
e de algumas bulas papais
que condenavam a escravidão apenas de
fachada.
*avós
janeiro
14, 2013
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